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João Batista Damasceno: Desorganização institucional

João Batista Damasceno: Desorganização institucional

Proclamada a República por um golpe militar, em 15 de novembro de 1889, o poder durou pouco nas mãos dos militares. Estes, em muitas oportunidades, intervieram nas instituições, sem jamais terem capacidade de governar. Vencem porque usam, contra a sociedade, as armas que ela custeia visando à sua defesa. Mas a dominação não se exerce pela força. O exercício regular do poder demanda legitimidade. O golpe empresarial-militar de 1964 somente possibilitou o exercício do poder por 21 anos, porque a classe dominante fazia parte do projeto e sustentou o regime enquanto se beneficiava dele. Quando começou a entrada de água no barco, o empresariado e a parcela da burocracia que sustentavam o regime cuidaram de desembarcar. A elite militar de então, notadamente os remanescentes do Movimento Tenentista, soube conduzir a abertura num processo lento, gradual e seguro. Os que poderiam embaralhar os interesses da classe dominante e conduzir demandas por alterações estruturais na sociedade, em benefício do mundo do trabalho, foram neutralizados. É emblemático que o regime soube conduzir o processo de tal forma que alijou a esquerda, notadamente a representada pelos comunistas, e os nacionalistas, representados pelos trabalhistas, e favoreceu a afirmação de grupo que se dispunha a administrar para o capital, mesmo que com discurso em prol dos trabalhadores.
 
Numa sociedade permeada por interesses em conflitos, sobretudo pela diversidade de classe social, uns sempre estarão em vantagem em relação a outros, dependendo de quem lhes defendam os interesses. Inexiste vácuo no espectro político. Se aqueles que se dizem à esquerda atuarem como se fossem do centro ou centro-direita, os que antes se diziam deste campo passarão a atuar na extrema direita em defesa desassombrada dos interesses do capital.
 
A abolição da escravatura em 1888 ensejou o golpe republicano no ano seguinte. Os “senhores de terras” se apropriaram das instituições estatais. Foi o preço que cobraram para não incendiarem o país quando tiveram que deixar de comerciar pessoas transformadas em mercadoria. A descentralização política implicou a supremacia do mando local. O poder foi entregue nas mãos dos “coronéis”. Uma das características da Primeira República, foi a desorganização do serviço público. Tudo estava entregue às mãos privadas, inclusive a força pública. Somente com a Revolução de 1930 foi estabelecido o Estado Nacional, que confrontou a ordem privada e promoveu a reorganização estatal.
 
No presente momento vivemos o mesmo dilema. As instituições estão sendo tomadas pelas oligarquias. As emendas parlamentares se destinam a financiar o poder local. O orçamento secreto impede a transparência e conhecimento do que é público. A administração pública está entregue aos “senhores locais”, sejam políticos paroquianos ou milícias.
 
O assassinato da juíza Patrícia Acioli no Dia do Magistrado, em 2011, e o atentado à vereadora Marielle Franco, no 24º dia da intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro, em 2018, que teve o general de exército Braga Neto como interventor e o general de exército Richard Nunes como Secretário de Segurança, nos possibilita entender que o crime organizado já não mais se intimida diante do poder do Estado. Ao contrário, se entrelaça com ele.
 
O ministro do STF, Flávio Dino, expressou preocupação com a falta de apoio para manter investigações sobre emendas parlamentares. Ele é relator de ações que questionam a falta de transparência nos pagamentos de emendas. Em 2024 chegou a determinar a suspensão do pagamento de 4,2 bilhões desses recursos e requisitou investigação pela Polícia Federal. Em agosto passado submeteu ao Tribunal de Contas da União análise de 964 emendas individuais que destinavam recursos públicos sem plano de trabalho e determinou que a Polícia Federal investigasse possíveis irregularidades. A mídia informa que o ministro teria expressado estar com "a cabeça a prêmio" no Congresso em razão de suas decisões.

O quadro no qual estamos inseridos denota gravidade, pelo comprometimento na atuação de agentes públicos. Os dois crimes contra a vida acima relatados demonstram a atuação marginal de agentes públicos. Há duas semanas a mídia noticiou que a PF estaria fechando cerco a financiadores da fuga do delegado e deputado federal Alexandre Ramagem e que teria prendido o filho de um garimpeiro em Manaus.
 
O delegado fugitivo fora condenado no mês de setembro a 16 anos, 1 mês e 15 dias de prisão por organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. Ele viajou de avião para Boa Vista (RR), seguiu de carro, saiu do Brasil de forma clandestina, pela Venezuela ou da Guiana, e rumou para os Estados Unidos. Ele tinha vínculos com o estado de Roraima, onde atuou como delegado da Polícia Federal e sua mulher é procuradora do estado. As pessoas que financiaram e organizaram a fuga de Ramagem devem ter motivos para as contribuições prestadas. Garimpeiro auxiliando fuga de delegado federal que tinha, também, a atribuição institucional de investigar garimpos ilegais em terras públicas federais não é bom indicativo.
 
Determinadas relações pessoais podem afrontar o princípio da impessoalidade. Assim como a relação com vendedores de gás, fornecedores de gatonet e de segurança clandestina nas zonas urbanas, a relação com garimpo pode ser fonte de problema institucional. As relações de agentes públicos com interesses privados devem ser muito bem explicitadas, sob pena de prejuízo aos interesses sociais.
 
 

Publicador: Marcos
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